O prédio da MPM em Porto Alegre, ali na Silveiro, 1.111, era habitado por figuras maravilhosamente folclóricas.
Uma delas era a dona Lídia. Uma senhora grisalha descabelada e enorme, que, graças aos vestidos sempre floriados, parecia um sofá imenso de 7 lugares. A dona Lídia tinha uma voz inversamente proporcional ao corpo, falava com um fio de voz meio trêmula e fininha.
Não sei bem o que a dona Lídia fazia ali, e acho que nem ela sabia. Mas todo mundo conhecia o prazer mórbido que a imensa senhora tinha ao se deparar com crimes e tragédias. Ela lia com avidez as crônicas policiais, e quanto mais marrom o veículo, mais ela delirava com os relatos sanguinolentos. Mas não bastava ler, era preciso fazer a crônica da morte noticiada. A dona Lídia quase babava de prazer quando contava o que lia aos colegas, acrescentando, claro, detalhes importantes como tripas espalhadas no asfalto, cérebros melecando a parede, corpos decompostos & afins.
Mas o melhor mesmo era quando ela tinha algum relato direto pra fazer, sem mediação de jornal ou jornaleco nenhum. E como a dona Lídia morava numa vila muito pobre e violenta, nunca faltava tragédia pra contar e estragar o apetite dos colegas.
Um dos pontos altos da vida da dona Lídia foi o dia em que ela pôde descrever minuciosamente como uma família inteira, incluindo crianças, um bebê, uma jovem grávida, um senhor de idade e possivelmente também cachorro, gato e tudo mais viraram churrasco - obviamente depois de sofrer muito muito muito, num terrível incêndio perto da casa dela. Ela falou do fogo, dos gritos, dos corpos carbonizados. Era coisa pra virar episódio dos mais escabrosos do CSI.
E a história terminava com a dona Lídia dizendo que o fogo tinha queimado tudo e todos. Haviam se ido a família, a casa, os móveis, o calendário da entregadora de gás, a foto do padre Reus na parede. Foi se tudo, naquele inferno de chamas.
- "Só sobrou o ferro. Só o ferro."
Dizia a dona Lídia, com sua vozinha, sacudindo um pouco o corpanzil e baixando a cabeça, não sei se em sinal de tristeza pelas mortes, ou pra esconder o sorriso de orgulho pelo impactante fim que ela tinha bolado praquela história de fogo e ferro.
quinta-feira, 20 de dezembro de 2007
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9 comentários:
Que horror! Por onde andará Dona Lídia? Na redação do Diário Gaúcho?
Legal, na MPM, pelo visto, além da tia do café e a tia do lanche, tinha a tia do sangue.
Infelizmente eu já vi muitas Donas Lídias por aí... Lamentáveis...
Ri à beça de "graças aos vestidos sempre floriados, parecia um sofá imenso de 7 lugares". Depois separei todos os meus vestidos floridos para doação :o
Maroto, nem todos os vestidos floridos ficam mal nas mulheres. É só questão de bom gosto na hora da escolha, o que a descrição dá a entender que faltava, naquele caso...
enio, eu suspeito que a silhueta da portadora influa muito no resultado final :o
guria! que belezoca, hein? parabéns pela seleção!
(e venuss: parabéns também, pelo nominho lá na lista!)
Maroto, com certeza a silhueta influi, não tem o que discutir. Mas a estampa também.
Eva e Venuss, posso dar parabéns às duas, então?
EVA: já te dei os parabéns via fone, agora vai via calçolas.
:)
PENKALA: pois é, o nominho tá na lista, mas sem chances, né? A começar que eu vou ter que assassinar a minha parceira de blog.
ENIO: os parabéns são todos da Eva, ela tirou o primeiro lugar. Eu fiquei em 4º, sendo que só tinham 2 vagas.
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