sábado, 5 de janeiro de 2008

Dinheiro I

Fui levar o marido pra tomar uma anti-rábica no Hospital Sanatório Partenon, lá onde fica o Hemocentro. Antes que alguém me pergunte se fui eu quem tasquei uma mordida no marido, já aviso que o bicho foi outro. E isso é uma outra história que, se sobrar tempo, eu conto aqui. Mas aí que fomos encaminhados pro hospital esse, que vem a ser o primeiro hospital público do RS, e onde fazem as tais vacinas anti-rábicas. Enquanto o marido conversava com a atendente, eu fiquei sentada aguardando. Uma menina, o irmão mais novo e a mãe, bem humildes, estavam por ali. A mãe foi chamada por um médico e deixou as crias na ante-sala. A menina, devia ter uns 6 anos, sentou do meu lado e começou a puxar papo:
- Como é teu nome, tia?
- Quem é esse tio que tá contigo?
E eu fui respondendo as perguntas até que ela tasca a clássica "me dá um dinheiro, tia?". Eu não tenho o hábito de dar dinheiro na rua. Acho que isso só agrava o problema. Compro comida e volto pra dar, mas não abro a carteira pra dar dinheiro, principalmente pra criança. Compro alguma coisa quando a pessoa tá vendendo algo, a gente faz algumas doações pra entidades, mas não costumo ceder aos 'me dá um dinheiro' que a gente escuta todo o dia por aí. Mas este da menina me pegou meio desprevenida. Mesmo assim, disse que não tinha trocado na bolsa. Ela insistiu, falou que estava desde ontem à noite por aí e 'me dá um dinheiro pra comprar leite, tia?'. Fui dizendo que não e não. Mas aí ela me desarmou quando disse que eu era pra comprar alguma coisa pra ela comer. E é bem isso o que eu faço nestes casos. Eu não estava querendo sair dali, queria ficar com o marido porque eu tive grande participação na mordida, embora não tenha sido com os meus dentes - eu já disse. E eu não conheço aquela região da cidade, não sei onde encontraria algum lugar com comida ali por perto.
Bom, pra aplacar a culpa que eu sentia de ter uma menina me pedindo insistentemente dinheiro, embora tenha sido muito fácil identificar que o pedido era mais do que bem ensaiado, eu acabei cedendo e abri a carteira. Entreguei dois reais. Nisso, o irmãozinho que tinha a metade da idade dela e que estava pulando no meio da sala de espera, correu pra enfiar a mão no bolso onde a guria guardou a nota e quis pegar a grana. Aí os dois começaram a brigar e se empurrar por aqueles dois reais. E o guri gritava 'me dá o meu dinheiro!' Ela empurrou a cria menor pro chão. O pequeno levantou e foi morder a irmã porque queria aquela nota. E eu no meio daquele furdunço. As crianças caíam pra cima de mim enquanto se engalfinhavam pelos dois reais.
Levantei e fui pra perto do marido. Nisso chegou outra pessoa e a guriazinha começou a se aprochegar do novo visitante pra aplicar o golpe. E ela deve vir repetindo essa atitude há um bom tempo. Aprendeu com alguém. E vai ensinar pra outros tantos alguéns. O primeiro vai ser o irmãozinho que ainda não sabe pedir, mas que sabe morder e arranhar pra conseguir dois reais.

5 comentários:

Maroto disse...

eu tive uma colega de trabalho (professora doutora Fulana de Tal) que foi menina de rua, de pedir dinheiro em sinaleira. Ela me ensinou a nunca, jamais, em tempo algum, dar dinheiro a crianças. Diz ela que sempre tem um adulto atrás que vai ficar com tudo, ou com a maior parte. Em geral pra comprar birita, ou pra devolver para a criança em troca dos mais horrendos 'favores'. Então que a gente faz muito bem de não dar e não precisa mesmo ficar com culpa - aliás, acho que não terias dado para a pedinte hospitalar também, se tivesses percebido que era tamanha monstrinha.
Agora conta aí, por que você mordeu o marido? E por que está negando?

Débora Elman disse...

Eu já caí em piores, e bem mais mal contadas. Maroto, deixa a menina soltar a fera no marido...e uma anti-rábica talvez cure outras rabias pro ano...

Marcia disse...

e mordeu onde, a gente pode saber? :o

Maroto disse...

DEBORA, sou mais a favor de morder gostosinho o marido... ando romântica, como sabes

Enio Luiz Vedovello disse...

Uma vez a minha esposa cedeu e deu dinheiro a uma menina na rua para
"comprar pão para o meu irmão", a menina pegou o dinheiro, entrou em uma banca de revistas, comprou um gibi e ainda saiu rindo e abanando-o em nossa direção e gritou "obrigado". Menos pior que não foi dinheiro que foi para algum adulto folgado, mas foi revoltante...